sexta-feira, 10 de julho de 2009

Os Meninos do Calhau

A tarde findava e o sol desaparecia por detrás das falésias, deixando no horizonte um recorte irregular num espectacular jogo de luz e de sombra. A maré baixava, deixando à vista as rochas maiores, cobertas por uma camada de verde escuro e a praia despedia-se dos seus últimos veraneantes, os meninos do calhau.
Os meninos do calhau, de lábios arroxados, com os dedos enrugados e cabelos salgados sabiam que voltariam na manhã seguinte, mas não queriam que os dias do calhau acabassem. O calhau era a sua escola de Verão, o seu pátio de brincadeiras e palco dos primeiros e inesquecíveis amores típicos da época. Os primeiros beijinhos, dados a medo por detrás de uma qualquer rocha, ou na escuridão de uma das muitas furnas, as mãozinhas dadas no caminho para casa e os primeiros presentes na forma de flores que brotavam da rocha.
Nessa noite, já na cama, quase que sentiam as ondas a embala-los até adormecer e o som do mar a se enrolar com o calhau repetia-se nos seus ouvidos, numa sinfonia sem fim.
Os meninos do calhau comiam as lapas vivas arrancadas da rocha com uma pedra mais achatada e os caramujos com um alfinete de dama. Pescavam "peixe cagão" à linha e deixavam-nos nas poças para voltarem ao mar quando subisse a maré. Comiam as sandes de pão duro pela hora de almoço, e um gelado de gelo com sabor a fruta pelo meio da tarde, não tinham medo das ondas e o mar tratava-os como se fossem os seus próprios filhos, não usavam creme protector e tinham um bronze natural todo o ano.
Hoje, ainda que longe, os seus Verões continuam a ser passados no calhau, deitados nos colchões de pedra com as conversas à babujinha e os beijinhos salgados...

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